Pesquisas no ES revelam uso sustentável de algas contra pragas na lavoura
Pesquisas exploram o potencial do mar para desenvolver produtos sustentáveis com alto valor econômico
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“A maioria das riquezas do planeta está no mar, embora sejam pouco conhecidas”, é o que afirma o professor de Química de Produtos Naturais do Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes) Campus Vila Velha, Hildegardo Seibert França.
A pesquisa, segundo o especialista, exerce papel importante nessa busca por aproveitar melhor e de forma sustentável as potencialidades desse ambiente.
Peixes, algas e corais, por exemplo, são objetos de pesquisas em instituições de ensino ao redor do mundo, inclusive no Espírito Santo — como o Ifes Campus Piúma, referência na área da pesca.
Do centro de pesquisa, saíram soluções pioneiras no País, que podem trazer grandes benefícios, segundo França, como a utilização da pele da tilápia como cicatrizante natural, substituindo o banco de pele humana.
Embora seja o campus de Piúma o especialista em vida marinha, o trabalho é realizado em sincronia com outros campi, que aprofundam e direcionam os resultados encontrados.
Com as descobertas a respeito das propriedades das algas, por exemplo, o campus do Ifes em Vila Velha, onde França é coordenador do Laboratório de Desenvolvimento de Bioprodutos (DBio), trabalha para a criação de produtos que podem ser utilizados efetivamente pelo mercado.
“A gente entra com a parte de pegar as algas e desenvolver um produto. Estudamos o que há na alga para usos como defensivo agrícola ou fertilizante”, explica.
Os defensivos são a recente descoberta. Foi identificada a potencialidade de que as algas não só ajudam a fazer as plantas estarem melhor nutridas, como também podem servir para afastar pragas, o que seria uma opção mais ecologicamente correta em comparação aos defensivos químicos, em alguns casos altamente contaminantes.
O objetivo, atualmente, é que os produtos desenvolvidos pelos estudantes para as empresas sejam mais conhecidos e projetados para o mercado nacional. Mas os envolvidos nos estudos também pensam grande.
“Precisamos estudas as principais para fazer produtos de qualidade tanto para o mercado nacional, quanto para o internacional”, diz o professor.
Dinheiro para projetos no ES
Pesquisadores da economia azul e verde — nomes dados ao uso de recursos naturais do mar e da terra de forma sustentável na dinâmica econômica — podem receber dinheiro da Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Espírito Santo (Fapes) para desenvolver projetos nessas áreas.
São dois editais, no total de R$ 6,7 milhões, para quem tem ideias de atividades que gerem impacto positivo em termos ambientais, sociais e econômicos, incluindo práticas agropecuárias sustentáveis, aquícolas e pesqueiras.
No primeiro, são R$ 2,7 milhões destinados a projetos de pesquisa individuais. Já no segundo, são R$ 4 milhões para projetos em grupo. As inscrições vão até 14 de maio, pelo site “sigfapes.es.gov.br”.
As ações vão abranger tanto áreas continentais quanto ecossistemas costeiro-marinhos e manguezais em áreas impactadas pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, no estado de Minas Gerais.
A utilização das algas marinhas é uma possibilidade de relação sustentável entre economia e meio ambiente. Utilizar elas não traz grandes impactos ao ecossistema, afirma o professor do Ifes Campus Piúma, André Batista, responsável por projetos pioneiros com a matéria-prima.
“As macroalgas arribadas podem trazer ganhos econômicos consideráveis na formulação de produtos, ainda mais por ser um recurso biodegradável em um momento que há escassez de recursos naturais.”
A transformação de resíduos do processamento do pescado — como vísceras — em fontes de energia, com foco na produção de biocombustíveis sólidos, como os carvões, é outro exemplo de investigação já realizada no âmbito acadêmico no Espírito Santo, como conta o professor.
Sustentabilidade e recuperação ambiental
A sustentabilidade e o uso responsável dos recursos naturais é um dos focos dos pesquisadores quando se fala na economia do mar — também chamada de economia azul.
São os restos, as sobras e os rejeitos de seres vivos marinhos que passaram a ser intensamente estudados, no intuito de aproveitar melhor as substâncias presentes nesse ambiente.
Os ingredientes marinhos são, inclusive, considerados uma evolução na qualidade nutricional, segundo o doutor em Nutrição Animal Douglas Haese.
“Eles reforçam a proposta de uma alimentação funcional, natural e sustentável, alinhada ao que há de mais moderno na nutrição.”
O uso econômico desse ambiente, que ocupa três quartos do planeta, deve considerar a sustentabilidade, proteção ambiental e a equidade social, defendem os pesquisadores Tássia Biazon, Monique Rached e Alexander Turra, em artigo na revista Ciência Hoje.
Estima-se que somente a pesca excessiva, a poluição, o desenvolvimento urbano costeiro e a mudança climática já causaram um declínio de 50% dos recifes de coral nos últimos 30 anos.
“Desde o pescador que tira seu sustento do mar até modernas tecnologias capazes de extrair recursos minerais em águas ultraprofundas, há um oceano de possibilidades para o uso econômico. Mas não pode ser voltada unicamente à exploração de recursos”, dizem.
Em 2024, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) destinou R$ 12 milhões para projetos voltados à economia azul na região sudeste, o que incluem os estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo. Estão incluídos, por exemplo, projetos para usos possíveis do mar na descarbonização da frota naval e na infraestrutura portuária.
Análise: “Exploração de forma desigual e fragmentada”

Apesar do vasto potencial da economia do mar, a exploração ocorre de forma desigual e fragmentada. Com um litoral de cerca de 400 km e uma posição de destaque na produção offshore de petróleo e gás natural, o Estado desempenhando um papel crucial no comércio internacional do País.
A economia azul é o conceito mais abrangente, englobando agendas como segurança marítima, sustentabilidade, planejamento espacial marítimo, e está intimamente ligada ao ‘crescimento azul’, pelo uso sustentável dos recursos marinhos para o desenvolvimento econômico, melhoria do bem-estar social e criação de empregos, conservando a saúde dos ecossistemas oceânicos e costeiros.”
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Outras matérias-primas
Outro material que pode ser e já é utilizado são os resíduos de peixes, empregados na produção de farinha para a fabricação de rações destinadas à alimentação animal.
No entanto, em alguns casos, esses resíduos encontram-se tão deteriorados que não servem nem mesmo para esse propósito.
Um projeto de pesquisa desenvolvido no Ifes Campus Piúma visa encontrar uma solução para a utilização desse resíduo como uma possível fonte de energia.
Esses resíduos de peixe podem ser usados na produção de biodiesel, biogás, e até mesmo em sistemas de aquaponia, que combinam a piscicultura com a hidroponia.
O reaproveitamento do pescado adicionado a outros compostos naturais é considerado na indústria por auxiliar a reduzir níveis de gás carbônico, por conta da utilização de energia a partir de matéria orgânica.
Fontes: citadas na reportagem e Fapeam
Lithothamnium calcareum: minerais que vêm do mar

Essa alga calcária se desenvolve nas profundezas frias do oceano. Após seu ciclo natural, suas estruturas ricas em cálcio, magnésio e outros minerais sedimentam no fundo do mar e são coletadas com responsabilidade ambiental.
Schizochytrium sp.: rica em ômega 3
Cultivada em ambientes controlados e sustentáveis, essa alga é fonte nobre de DHA (ácido docosa-hexaenoico), um tipo de ômega 3 essencial à saúde neurológica e imunológica, com benefícios no desenvolvimento cognitivo e função cerebral.
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