Sobra virando sabor
Artigo publicado no jornal A Tribuna
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Quando cheguei a Nova Petrópolis, na Serra Gaúcha, caro leitor, fui indagado com uma pergunta: o que fazer com uma árvore que se espalhou demais?
De início, não entendi, mas bastou uma conversa para entender que a resposta estava lá, diante dos meus olhos, na propriedade de Lucas Bauer, entre móveis rústicos, sacos de serragem e... cogumelos. Mas calma, vamos por partes.
A Uva do Japão, aquela árvore de folhas finas e tronco marcado, foi trazida ao Brasil com um objetivo simples: embelezar paisagens. Só que, como acontece com muitas histórias, o plano inicial não saiu como esperado. Ela se espalhou, invadiu espaços e se tornou um problema ambiental. Foi assim que encontrou seu lugar no terreno da família Bauer.
Lucas me contou que a solução foi encarar o desafio de frente. Começaram cortando as árvores e logo descobriram a beleza escondida na madeira. Móveis incríveis nasceram: mesas, cadeiras, peças que carregam história e sofisticação. Mas, como em toda produção, havia um “porém”. No caso, um rastro de serragem que parecia não ter utilidade.
É aqui que a história toma um rumo fascinante. A serragem, que antes era vista como sobra, virou base de um novo projeto: a produção de cogumelos. No laboratório, Lucas mistura a serragem com sementes em um processo que exige precisão e cuidado. Depois, o substrato vai para a incubadora, onde temperatura e umidade são controladas milimetricamente. Só então os cogumelos seguem à estufa, um espetáculo de tecnologia e dedicação.
Enquanto Lucas falava, era impossível não imaginar a transformação acontecendo. Aquela serragem esquecida agora dava vida a cogumelos frescos, que saem direto para as mesas de restaurantes finos. Visitei um, o Catherine, em Gramado, e vi o chef cortar os cogumelos com a delicadeza de quem sabe o valor de um produto especial. O prato que provei? Uma explosão de sabores, daqueles momentos que você não esquece.
Mas esta história vai além do empreendedorismo. Em Nova Petrópolis, estamos no berço do cooperativismo no Brasil e na América Latina. Foi aqui que surgiu a primeira cooperativa de crédito do País, e a família Bauer tem raízes profundas nesse movimento. Talvez seja isso que explica a forma como eles enxergam oportunidades onde outros veem obstáculos.
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Enquanto me despedia, olhando para as árvores de Uva do Japão que ainda cercam a propriedade, pensei no poder de transformar o comum em extraordinário. A madeira virou arte, a serragem virou alimento, e a tradição se reinventou. E, assim, a história dos Bauer é um lembrete de que a criatividade pode florescer até mesmo nas sobras.
Da próxima vez que você olhar para uma árvore ou para o que parece ser um resíduo, pense bem. Talvez ali esteja o começo de algo que ainda não imaginou.
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