Projeto bilionário da China pode ligar ferrovia de Vitória ao Peru
Transoceânica é um projeto com 4.400 km só no Brasil, ligando o litoral brasileiro ao Oceano Pacífico, com megaporto em Lima
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Vitória, banhada pelo Oceano Atlântico, pode ganhar uma ligação ferroviária até o outro lado do continente, no Pacífico. O projeto tem a China entre os protagonistas, com a construção da ferrovia Transoceânica, ligando o litoral brasileiro ao megaporto de Chancay, em Lima, no Peru.
Chamada de EF-354, a via é uma iniciativa conjunta do Brasil, China e Peru. Só em território brasileiro, são mais de 4.400 quilômetros para ligar Lima ao Porto de Açu, em São João da Barra, no Rio.
O Estado teria, pela proposta, duas ligações com a nova ferrovia. Uma delas é em Ipatinga, onde a EF-354 faria um cruzamento com a Vitória a Minas (EFVM). A outra seria no Porto do Açu, já que a EF-118, via planejada para ligar o Espírito Santo e o Rio, passa por lá, com estação ferroviária em Campos, município vizinho do terminal.
O secretário de Estado do Desenvolvimento, Sérgio Vidigal, destacou a importância do projeto para o Espírito Santo.
Ele frisou que a Transoceânica cria um corredor logístico entre o Atlântico e o Pacífico, facilitando o comércio com a Ásia. Mas lembrou que conclusão da EF-118 é essencial para a proposta:
“A EF-118 permitirá a integração com a Norte-Sul e o escoamento da produção do Centro-Oeste. O projeto reduzirá custos e tempo de transporte, tornando os produtos brasileiros mais competitivos. Apesar dos desafios logísticos e financeiros, sua implementação pode impulsionar o desenvolvimento econômico regional e fortalecer o comércio internacional”, disse.
Vidigal lembrou que é preciso contar com a iniciativa privada, por meio da Vale, para a construção do Ramal Anchieta, trecho da EF-118 até a cidade do litoral sul, a ser construído pela mineradora: “A colaboração entre o setor público e privado é, portanto, essencial para a concretização da EF-118.”
A Transoceânica não está só no papel em sua totalidade: a estrutura já tem prontos todos os estudos de viabilidade do trecho que atravessa o Centro-Oeste, e já tem até partes em construção em Goiás.
Segundo o governo federal, mais detalhes serão apresentados na apresentação do Plano Nacional Ferroviário, ainda sem data marcada após atraso no início do ano.
Entenda
A história do projeto
Em 2015, os governos de China, Brasil e Peru assinam entendimento para a construção de uma ferrovia bioceânica. A China aceitou financiar o trecho entre Mara Rosa até Lima.
Em 2016, os estudos de viabilidade já estavam prontos e a China prometeu “investimentos múltiplos”.
Financiamento
Inicialmente, o projeto teria financiamento pelo Banco de Investimento de Infraestrutura Asiático e seria ligado à Iniciativa do Cinturão e Rota, chamada de Nova Rota da Seda. Porém, na visita do presidente Xi Jinping ao Brasil em 2024, o país rejeitou a adesão ao programa chinês.
O ambicioso projeto chinês prevê a construção ou financiamento de projetos de infraestrutura pelo mundo em países parceiros. Ficou acertado, porém, que Brasil e China iriam promover “projetos sinérgicos”. Esse acerto sinalizou a possibilidade de cooperação via Banco dos Brics.
E o dinheiro? Ainda não foi divulgada uma nova previsão de custos e como será o investimento chinês.
A mais recente sinalização positiva foi dada pelo Novo Banco de Desenvolvimento (NBD, o “Banco dos Brics”). Reeleita presidente da instituição, Dilma Rousseff, reforçou que a estrada de ferro está entre os projetos que irão avançar em seu próximo mandato à frente do banco.
Megaporto no Peru
A outra ponta a que chegará a ferrovia é o Megaporto de Chancay, a cerca de 70 km da capital peruana.
Investimento Chinês: o porto tem investimentos na casa de US$ 3,4 bilhões (cerca de R$ 20 bilhões).
A companhia estatal chinesa Cosco Shipping Company lidera a construção e tem 60% de participação, com os outros 40% na mão da companhia peruana Volcan. O porto é visto como um caminho direto para exportações para a China, criando a conexão “Xangai-Chancay”.
GRÃOS. A China é o maior parceiro comercial do Brasil e, em 2024, 33% do que exportamos foi soja. A China compra 70% da soja exportada pelo Brasil — US$ 30 bilhões (R$ 170 bi).
Fonte: Governo federal.
Projeto pode custar 100 bilhões de reais, diz especialista
Para custear as várias fases do projeto, os financiamentos podem ser fatiados e, juntos, devem somar R$ 100 bilhões. É o que prevê o coordenador dos cursos de Relações Internacionais e Comércio Exterior da UVV, Daniel Carvalho.
“Esse projeto é viável e talvez até uma opção de financiamento melhor que com o Banco Mundial. No caso, a ideia do NBD (Novo Banco de Desenvolvimento, dos BRICS) é oferecer uma alternativa ao sistema financeiro internacional já consolidado”, explicou.
Diferentemente do Banco Mundial, como explicou, os financiamentos do NBD têm parcelamento mais flexível de acordo com o tipo e tamanho do projeto, taxas de juros competitivas para atrair novos projetos e permitem pagamentos em moeda local, de modo a reduzir riscos cambiais.
“Este ponto é particularmente importante para o Brasil dado o contexto atual de alta do dólar e sem perspectiva de queda significativa até 2028 segundo o último Boletim Focus”, salientou.
Segundo ele, em janeiro, o capital integralizado do NDB era de US$ 52,7 bilhões dos quais US$ 32,8 bilhões já estavam comprometidos com financiamentos de 96 projetos.
“É muito difícil que o NDB – ou qualquer outro banco de fomento – comprometa todo o valor que tem disponível em um projeto apenas e de uma vez. Eventualmente, não espantaria ver outras instituições financeiras internacionais complementando esse financiamento, como o BID e até o mesmo o BNDES no futuro”.
Já Fernando Otávio Campos, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis do Estado (Abih), pondera é preciso vencer muitos obstáculos para a ferrovia, e o principal é tornar real o trecho do Estado (EF-118), que até o momento não tem cronograma.
“A falta de data atrasa investimentos, instalação de empresas que até poderiam trazer mais viabilidade para o Ferrovia Transoceânica e já estar gerando recursos para os cofres do Estado”. No seu entendimento, também é necessário vencer obstáculos políticos e concorrências entre estados e municípios.
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