Passar em concurso público e virar servidor vai ficar mais difícil
Ser aprovado em concurso público e seguir carreira faz parte do sonho de muita gente. Só que com a reforma administrativa será mais difícil conseguir vaga no funcionalismo.
Os impactos dessa nova reforma nos concursos foram detalhados pelo secretário de Gestão e Desempenho de Pessoal do Ministério da Economia, Wagner Lenhart. O vínculo de experiência, como pontuou, é uma das principais mudanças. Só os que tiverem as melhores avaliações poderão ingressar no serviço público.
Hoje, a Constituição prevê que o concursado seja empossado após sua aprovação e deve cumprir três anos de estágio probatório. Porém, a reforma cria uma etapa entre as provas do concurso e o ingresso nos cargos: o vínculo de experiência.
Nas carreiras típicas de Estado, a exemplo dos diplomatas e auditores fiscais, esse período será de dois anos. Para os demais cargos, o vínculo será de um ano, pelo menos.
Passada essa etapa, apenas os profissionais que conseguirem os melhores desempenhos serão empossados na função.
Lenhart reforçou que a ideia não é que todos sejam aprovados, mas que haja um sistema competitivo.
De acordo com ele, o edital do concurso trará o quantitativo de aprovados que cumprirá o vínculo de experiência e aqueles que serão admitidos no serviço público.
Para o advogado Raphael Câmara, especialista em Direito Público, esse rigor é muito positivo. “Ser aprovado em concurso público é só o primeiro passo de acesso ao cargo, devendo o servidor demonstrar excelência ao longo da carreira”.
O professor de Direito Administrativo Anderson Pedra ressaltou que ainda há dúvidas sobre como será essa situação do vínculo de experiência na prática.
“É interessante e uma boa saída na teoria, mas não é a salvação. Como colocar 50 pessoas para trabalhar, pagar 50 remunerações durante dois anos, para ficar com 20, por exemplo? Além do custo, tem a questão do volume de serviço.”
Ele salientou que o que ficará mais difícil é o vínculo com a administração pública. “Para o candidato preparado, o grau de dificuldade é o mesmo.”
“Rigor vai permitir que melhores entrem”
Dos pontos da reforma administrativa, ela entende que a questão da estabilidade é o que deve impactar, embora isso não a faça desistir.
Sobre o processo ser mais rigoroso devido às avaliações de desempenho para se efetivar na vaga, ela é favorável. “Em alguns casos, após o período probatório, vem o conformismo. Por isso, acho que ter rigor maior vai permitir que os melhores sejam selecionados para o serviço público.”
O QUE MUDA PARA OS NOVOS SERVIDORES
Reforma administrativa
- Tramita no Congresso Nacional uma proposta de reforma apresentada pelo governo federal no início do mês.
- O objetivo da reforma é alterar as regras para os futuros servidores ingressarem em cargos públicos, por meio de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC). A matéria precisa ser aprovada por 3/5 da Câmara e do Senado para virar lei.
Para quem vale a reforma
- Caso as regras sejam aprovadas, elas vão valer apenas para futuros servidores dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário da União, estados e municípios. Ou seja, quem vai ingressar em concursos após a aprovação da reforma.
- Para os atuais servidores não muda nada. Continuam com seus direitos atuais garantidos e sua remuneração.
Ficaram de fora
- Apesar de ser voltada a servidores dos três poderes, a reforma não vai atingir parlamentares, magistrados (juízes, desembargadores e ministros dos tribunais superiores), promotores e procuradores, nem os militares.
- O governo federal explicou que eles são membros de poderes e, por isso, têm regras diferentes dos servidores comuns.
ALGUMAS REGRAS
1 - Tipos de servidores
VÍNCULO DE EXPERIÊNCIA
- Antes que os candidatos ingressem no cargo típico de Estado ou no cargo de prazo indeterminado, terão de passar por um período de experiência.
- No caso das carreiras típicas de Estado, como diplomatas e auditores fiscais, esse período será de dois anos. Para os demais cargos, o vínculo será de, pelo menos, um ano.
- Exemplo: 50 candidatos passariam pelo vínculo de experiência e somente 20 poderiam ingressar no cargo. Os 30 que não passarem nas avaliações de desempenho serão desligados. Com mais uma etapa para seleção, o processo ficaria mais difícil.
CARGO TÍPICO DE ESTADO
- Terão regras parecidas com as atuais, com estabilidade. O ingresso será por meio de concurso público.
- Essas carreiras são compostas por servidores que exercem atividades exclusivamente públicas e que são indispensáveis para a existência ou representação do Estado.
- Como não existe uma lista formal desses cargos, o governo terá de apresentar outra proposta legislativa com a listagem.
CARGO POR PRAZO INDETERMINADO
- Não terão a estabilidade de hoje; poderão ser demitidos em um momento de necessidade de cortes de gastos, por exemplo; e o ingresso se dará por meio de concurso público.
- A maioria dos servidores será contratada nesse regime.
VÍNCULO DE PRAZO DETERMINADO
- Não terão estabilidade. Ingresso será por seleção simplificada.
CARGOS DE LIDERANÇA E ASSESSORAMENTO
- Com vínculo temporário. Ingresso por seleção simplificada e sem estabilidade.
2 - Estabilidade
- Pela regra atual, todo servidor público é estável no cargo.
- Pela proposta do governo, a estabilidade passará a ser garantida apenas para servidores das chamadas carreiras típicas de Estado.
- Essas carreiras são aquelas que só existem na administração pública, e que hoje incluem ocupações como as de auditor da Receita Federal, diplomata e técnico do Banco Central (BC).
- Hoje não existe definição formal de quais seriam essas carreiras. Uma lei posterior deverá definir quais são as ocupações típicas de Estado, o que ainda deve criar discussões e pressões por parte de algumas categorias.
3 - Demissão de servidor
- Hoje, a demissão só ocorre quando há sentença final da Justiça, sem possibilidade de recurso; por infração disciplinar.
- Caso seja aprovada, nos casos em que a demissão é discutida na Justiça, não será mais necessário aguardar decisão final.
4 - Demissão por baixo desempenho
- O governo federal vai elaborar um projeto de lei complementar que regulamenta a possibilidade de desligamento do servidor por “baixo desempenho”.
- Esse regulamento vai valer tanto para os atuais quanto para os futuros servidores.
5 - Acúmulo de cargos
- Pelas regras atuais, não é permitido aos servidores acumular cargos ou empregos públicos, exceto em funções de professor e profissional de saúde.
- Para os servidores ocupantes de carreiras típicas de Estado, é vedada a realização de qualquer outra atividade remunerada, incluída a acumulação de cargos públicos. A exceção está somente para a função de professor e atividades na área de saúde.
- Para os demais servidores, é autorizada a acumulação remunerada de cargos públicos, quando houver compatibilidade de horários e não houver conflito de interesse.
6 - Extinção dos penduricalhos
- A reforma do governo acaba com os chamados “penduricalhos ”, que são benefícios, além do salário, hoje garantidos a servidores.
Ficam extintos:
- Licença-prêmio (direito do servidor a três meses de licença, a cada cinco anos, para tratar de assuntos de interesse pessoal);
- Adicional por tempo de serviço (eleva o salário dos servidores em 1% a cada ano);
- Aposentadoria compulsória como punição;
- Aumentos retroativos;
- Férias superiores a 30 dias ao ano;
- Parcelas indenizatórias;
- Adicional ou indenização por substituição;
- Redução de jornada sem redução de remuneração;
- Progressão ou promoção baseada exclusivamente em tempo de serviço;
- Incorporação ao salário de valores referentes ao exercício de cargos e funções.
7 - Extinção de cargos e órgãos
Hoje, só pode ser feito por meio da aprovação de um projeto de lei no Congresso. Pela proposta, via decreto, o presidente da República pode:
- Extinguir cargos (efetivos ou comissionados);
- Funções e gratificações;
- Reorganizar cautarquias e fundações;
- Transformar cargos, quando vagos, mantida a mesma natureza do vínculo;
- Reorganizar atribuições de cargos do Poder Executivo;
- Extinguir órgãos (como Ibama).