Por que a solução pacífica dos conflitos, no Brasil, é tão difícil?
Confira a coluna desta terça-feira (11)
Muito se discute por que a solução não contenciosa de conflitos (negociação, mediação e conciliação), mesmo com os avanços trazidos pelo Código de Processo Civil de 2015, ainda encontra resistência para efetivar-se plenamente. Há quem diga que isso se relacione à formação dos advogados, que via de regra são formados, sobretudo, para o combate jurídico.
A maior parte dos problemas da vida tem uma causa que pode ser atribuída a alguém, que voluntária ou involuntariamente provocou. Se as pessoas fossem sempre honestas e fidedignas, o único esforço que realizariam seria o de trazer a luz a verdade dos fatos. Porém, o orgulho e a vaidade, na maioria das pessoas, fazem com que, nos conflitos de interesse, não se dispute pela verdade, mas sim para ver quem tem a razão, o que explica o emprego artifícios inescrupulosos em defesa de um ponto de vista.
Aqui, cabe uma breve análise do conceito de cultura. Essa palavra, cunhada há muito pelos romanos, originava-se da forma verbal cultivare e significava nutrir.
Posteriormente, ela foi empregada para descrever o processo de formação das pessoas, pois acreditava-se que, enquanto o alimento nutri o corpo, o conhecimento nutri o espírito. Com efeito, somos, em grande medida, o que vemos, ouvimos e, principalmente, lemos.
No Brasil, como se sabe, o nível de leitura, lato sensu, e por conseguinte, cultura, da maior parte da população é muito baixo, o que, em certa medida, explica muitas vezes a dificuldade em se estabelecer o diálogo como forma de resolver questões simples do dia a dia.
Retornando ao problema da vida, em uma batida de carro, por exemplo, a probabilidade de isso resultar em contenda é enorme. Nesse caso, comumente, há dois tipos de pessoas. Uma busca resolver as coisas de modo diplomático e pacífico; outra é inflexível e quer ter a razão em tudo. O que inviabiliza, decerto, a comunicação entre ambas é a percepção, por parte da primeira, de que sua dignidade é afrontada ante as investidas incisivas da parte da segunda.
Na verdade, diante disso, a própria honra, enquanto “a forma como alguém se faz representar na cabeça de outrem”, é o que determina o conflito. Visto que em uma desavença, amiúde, ninguém quer se fazer representar como fraco ou perdedor, logo iniciam-se ultrajes recíprocos, ou seja, deixa-se de lado o problema a ser resolvido para atacar-se mutuamente. As ofensas, agressões e vias de fato serão mais tarde fatores que, certamente, impossibilitarão uma solução não contenciosa de resolução de conflitos.
De fato, a predominância cultura da adjudicação em detrimento da autocomposição pode ocultar raízes profundas no Brasil e se relaciona com o fato de que, via de regra, não temos sido educados para o diálogo. Por isso, é importante a iniciativa de fomentar nas escolas de ensino básico projetos que promovam a negociação, a mediação e a conciliação como formas de resolução de conflitos, de modo que as gerações futuras estejam menos inclinadas a resolver tudo pelo viés jurídico.
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