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Tribuna Livre

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Colunista

Leitores do Jornal A Tribuna

Por que a solução pacífica dos conflitos de interesses é difícil?

Confira a coluna desta segunda (06)

Flávio Santos Oliveira | 06/01/2025, 16:12 h | Atualizado em 06/01/2025, 16:11

Imagem ilustrativa da imagem Por que a solução pacífica dos conflitos de interesses é difícil?
Flávio Santos Oliveira é professor e doutor em História pela Ufes

Muito se discute por que, no Brasil, as práticas de solução não contenciosa de resolução de conflito (negociação, mediação e conciliação), mesmo com avanços trazidos pelo Código de Processo Civil de 2015, ainda encontram resistência para efetivar-se plenamente. Uma resposta para isso pode de ser dada pela História.

Há muito tempo Aristóteles dizia que “conhecer é revelar causas”. Tendo em conta a máxima ex nihilo nihil fit (do nada nada provém), todo “problema da vida” tem uma causa que pode ser atribuída a alguém, que voluntária ou involuntariamente o provocou.

Se as pessoas fossem inteiramente honestas e fidedignas, todavia, o único esforço que realizariam seria o de trazer à luz a verdade dos fatos. Porém, a vaidade e desonestidade quase inatas na maioria das pessoas fazem com que, nos conflitos de interesse, não se dispute pela verdade, mas sim para ver quem tem a razão, o que explica a elaboração e o emprego dos artifícios mais inescrupulosos para se defender um contra o outro.

Aqui cabe, talvez, uma análise do conceito de cultura. Essa palavra foi cunhada pelos romanos e significava nutrir (cultivare). Daí provém o termo agricultura, ou seja, nutrir a terra (agro). Posteriormente, ela foi empregada, na língua alemã, para descrever o processo de formação das pessoas (bildung), pois percebeu-se que, enquanto o alimento nutri o corpo, o conhecimento nutri o espírito. Com efeito, somos, em grande medida, o que vemos, ouvimos e principalmente lemos.

No Brasil, o nível de leitura e interpretação crítica da maior parte da população é muito baixo, o que, de certa forma, explica a dificuldade de estabelecer diálogo para resolver questões simples do dia a dia.

Retornando ao problema da vida, em uma batida de carro, por exemplo, a probabilidade disso resultar em querelas são enormes. Nesse ponto cumpre destacar que, em geral, há dois tipos de pessoas que assumem diferentes posições ante uma situação como essa. Uma é pacífica e quer resolver as coisas de modo diplomático; outra é inflexível e quer ter a razão em tudo. O que inviabiliza, decerto, a comunicação entre ambos é a percepção da parte do primeiro de que sua dignidade é violentada ante as investidas muitas vezes incisivas da parte do segundo.

Nesse caso, o próprio conceito de honra, entendida como a forma como alguém se faz representar na cabeça de outrem, é o que determina o conflito. Como num embate, ninguém quer se fazer representar como fraco ou perdedor. Logo, iniciam-se os ultrajes recíprocos, ou seja, deixa-se de lado o “problema da vida” a ser pacificamente resolvido, para atacarem-se mutuamente. As ofensas, agressões e vias de fato serão mais tarde fatores que vão impossibilitar uma solução não contenciosa de resolução de conflitos.

Conclui-se que a predominância cultura da sentença e da adjudicação em detrimento da cultura da pacificação tem raízes mais profundas no Brasil e se relaciona com o fato de que, em geral, não somos educados para o diálogo. Isso somado ao fato de que a formação dos operadores do direito é voltada em geral para o combate jurídico, explica o abarrotamento de ações em praticamente todas as instâncias do Poder Judiciário brasileiro.

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