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Leitores do Jornal A Tribuna

Liberdade: privada e pública

Leia a coluna de sábado (28)

Luciano Fazio | 30/12/2024, 13:23 h | Atualizado em 30/12/2024, 13:23

Imagem ilustrativa da imagem Liberdade: privada e pública
Luciano Fazio é graduado em Matemática pela Università degli Studi di Milão (Itália) e pós-graduado em Previdência pela FGV

Recentemente, o governo italiano anulou as multas impostas aos chamados “no vax”, pessoas que se recusaram a vacinar contra a covid-19. Além disso, recorreu à requisição obrigatória para impedir greves no setor de transportes, realizadas em protesto contra a política econômica adotada. Essas decisões remetem ao significado da liberdade, reinterpretando-o de forma preocupante.

Pelo dicionário, a liberdade é a “possibilidade de o sujeito agir (ou não agir) sem coerções externas e de se autodeterminar, escolhendo autonomamente os fins e os meios para alcançá-los”.

Essa definição está associada à liberdade na “esfera privada”, uma garantia do indivíduo contra restrições, geralmente impostas pelo Estado. Embora a História demonstre o risco do despotismo estatal, quando absoluta, essa liberdade é ilusória e pode até ser perigosa.

Na prática, a ideia de liberdade absoluta não se sustenta. As restrições à liberdade não são impostas só pelas leis, mas também pela natureza e realidade socioeconômica. A falta de limites externos não assegura a plena realização dos desejos individuais, até porque a própria liberdade de escolha implica renúncias e perdas. Assim, a crença em um sujeito totalmente “livre” revela-se ingênua, ao idealizá-lo como um herói capaz de tudo.

Ademais, a absolutização da liberdade privada ignora que o homem é, por natureza, um “ser político”, cujas ações afetam os outros. Assim, frequentemente resulta em condutas pouco éticas. Em particular, os “no vax” ignoram que seus corpos podem causar sofrimento e até a morte para outras pessoas, mesmo de forma involuntária.

Além disso, a ação “livre” de alguns, sobretudo se dotados de mais poder e riqueza, pode impedir a igualdade mínima, ao prejudicar o acesso dos vulneráveis aos direitos fundamentais, como vida, saúde, educação, trabalho e assistência.

Para estabelecer limites à liberdade privada, surge a liberdade “pública”, que não a substitui, mas a complementa. Em uma perspectiva contratualista, essa segunda forma de liberdade reconhece os diferentes interesses e opiniões, buscando construir – sem despotismos e com a participação cidadã – as normas que regem a vida coletiva. Essas normas devem, simultaneamente, proteger e regulamentar a liberdade privada.

Nesse contexto, até as greves, que o atual governo italiano busca impedir, são expressões fundamentais de liberdade pública. Elas asseguram à sociedade a capacidade de influenciar os rumos coletivos, ressoando a frase: “Liberdade é participação”. Proibi-las representaria um grave ataque às liberdades democráticas.

Mais de 200 anos após a Revolução Francesa, a busca pelo equilíbrio entre liberdade e igualdade, assim como entre liberdade privada e liberdade pública, segue essencial. Como advertia Hobbes, a ausência de regulamentação adequada da liberdade privada tende a criar cenários em que “o homem é o lobo do outro homem”, “a lei da selva” na nossa linguagem. Como solução, o filósofo defendia o poder absoluto do soberano.

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