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Cidades

"Não sei demonstrar afeto, pois não recebi”, diz gerente administrativo

Diante dos problemas psicológicos que o abandono pode trazer, pais podem ser obrigados a pagar multas por não visitar os filhos


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Crescer rodeado de carinho, atenção e cuidados parece ser algo tão simples no ambiente familiar, mas nem sempre é o que acontece na realidade. Longe dos filhos menores de idade, pais têm sido obrigados a pagar multa diária de até R$ 100 por não visitá-los.

Um dos casos que tramita na Justiça envolve uma criança de 4 anos. Havia acordo para que o pai, que se separou da mãe da criança em 2020, durante a pandemia da covid-19, visitasse o filho a cada 15 dias, o que não acontecia. 

Diante do descumprimento, a advogada Rayane Vaz Rangel entrou com uma ação pedindo a aplicação de uma multa ao pai, cujo valor é arbitrado pelo juiz. 

“Esse pai visita o filho quando quer, fica um mês sem ver a criança, que tem esse direito  garantido. É dever do pai promover essa convivência. Mesmo quando ele não quer conviver, o juiz vai arbitrar dias de visita”. 

A defensora pública Priscila Libório, da 1ª Vara de Família de Vitória, já atuou em alguns casos e conta que a Justiça tem fixado, em média, multa de até R$ 100 por dia. Ela, inclusive, atua em um caso. 

A advogada Flávia Brandão, presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família no Estado, citou um caso de uma  mãe que, por ser muito nova quando se separou do marido, deixou a guarda dos dois filhos com o pai e foi viver a sua vida. 

“Ela não se preocupava com a rotina de convivência com os meninos, aparecendo quando desejava. O pai, por ver que os filhos estavam ficando emocionalmente desestruturados, ingressou requerendo o cumprimento da convivência da forma estipulada”.

Segundo ela, a mãe recebeu a intimação e, mesmo assim, continuou com a não respeitar os filhos. “Ela marcava e não ia buscá-los e no fim, foi efetivamente estipulada multa por descumprimento, R$ 500 por final de semana não cumprido. Neste caso, deu super certo e a convivência está ótima”. 

Mas ela destaca que nem sempre a imposição de multa pode ser a solução para resolver a negligência da figura paterna ou materna.

“Quando após um rompimento um dos genitores não deseja assumir suas responsabilidades com seus filhos, nem mesmo a multa vem a ser solução. Muitas vezes pode se tornar um ponto de atrito ainda maior, afastando definitivamente do convívio com os filhos”.

“Não sei demonstrar afeto, pois não recebi”

Imagem ilustrativa da imagem "Não sei demonstrar afeto, pois não recebi”, diz gerente administrativo
Gerente administrativo conta que nunca recebeu afeto do pai |  Foto: Acervo Pessoal

Vinte e seis anos se passaram sem contato direto ou qualquer tipo de afeto paternal, sem um parabéns no dia do aniversário, sem um presente no Dia das Crianças, sem um Feliz Natal. 

Depois de décadas, um gerente administrativo - que chegou a ajuizar uma ação na Justiça por abandono afetivo contra o pai, mas desistiu - admitiu para a reportagem que o único sentimento que tem pelo pai é de pena.

A TRIBUNA - Nunca teve a figura de um pai durante sua infância ou adolescência? 

Gerente administrativo - Eu sou o filho mais novo do meu pai. Ele tem, ao todo, sete filhos, em três casamentos. Eu nasci no segundo relacionamento dele, minha mãe foi a amante. Depois de um tempo, ela acabou precisando cortar relações com meu pai.

- -Ele era agressivo?

Ele agredia muito a gente quando se sentia no direito de nos disciplinar. Teve uma situação que eu e a mãe estávamos na casa da minha avó. Na ocasião, fui com meus primos para à beira de um riacho, quando meu irmão acabou se molhando. Meu pai ficou muito bravo, quis bater no meu irmão e minha mãe entrou na frente e recebeu um soco na costela, o estopim para o fim da relação. 

- Após a separação, seu pai acabou se afastando de você?

Desde que eles separaram, ele se afastou da gente. Eu sempre tentava ter alguma relação. Já até tentei morar com ele, após um período de brigas com meu irmão mais velho. Meu pai, como sempre,  não era presente e não deu nenhum suporte emocional pra mim. Depois dessas situações e devido a outros fatores, quando eu já era adolescente, saí de casa. 

- Não cresceu com carinho paterno? Como isso te afetou? Sofria muito?

Eu já tenho 26 anos, hoje tenho uma situação mais confortável. Acho que um dos principais fatores da ausência dele foi dificuldade financeira. Ele pagava  R$ 200  de pensão, e minha mãe criava eu e meu irmão fazendo faxinas. Minha  expressão social hoje é totalmente influenciada por todas as coisas que ele fez comigo quando criança. Hoje eu também tenho, inclusive, abandono afetivo da minha mãe, que acabou virando usuária de drogas.  

- Há quanto tempo não vê o seu pai?

A última vez foi em janeiro deste ano, por iniciativa minha. Não fui convidado. Cheguei na casa dele com meu irmão, levamos a minha sobrinha também. Consegui vê-lo, porém ele conversava pouco. Minha madrasta disse que ele está isolado há algum tempo, prefere ficar mais sozinho. Provavelmente deve ter um quadro depressivo. Hoje em dia eu tenho pena dele, essa é a palavra.

- Chegou a receber pensão? 

Sim, mas ele recorreu à Justiça quando eu tinha entre 23 a 24 anos. Ele alegou que eu estava trabalhando. De fato, eu tinha acabado de ser promovido para gerente de loja e passei a ganhar bem. Esse foi um dos fatores que fez com que eu desistisse de processar meu pai para que houvesse indenização por abandono. 

- O desgaste emocional também influenciou para desistir do processo?

Com certeza. E também, naquele momento, eu estava lidando com a situação de dependência da minha mãe. Não tive condições de ter mais essa pendência.

- Como são suas características pessoais?

A situação do pai ausente e mãe dependente química gera dor, mas hoje em dia não sinto tanto. Sou uma pessoa de poucos abraços, não sei trocar palavras carinhosas. Não sei definir exatamente o que é o amor. Não sei demonstrar afeto, pois não recebi.  

Eu cresci em meio a muita confusão, agressividade, mas a convivência com a família do meu  marido, por três anos moramos junto com eles, me fez uma pessoa mais compreensiva, mais calma.  

- Atualmente você está bem?

Estou. Poderia estar melhor, caso minha mãe estivesse saudável. Vivo minha vida e tento não deixar nada me atingir.

Especialistas fazem alerta para traumas

As atitudes de pais que abandonam seus filhos podem gerar diversos traumas para as crianças e adolescentes. De acordo com especialistas, podem ser desenvolvidos problemas de ansiedade, desobediência e até tipos de violências físicas ou psicológicas.

Segundo o psicólogo e professor universitário Felipe Goggi, a proximidade familiar pode possibilitar o estreitamento dos sentimentos, porém uma relação conflituosa por algum tipo de divergência pode gerar afastamentos irreparáveis.

“Em geral, a sociedade idealiza relações familiares que os pais cuidam dos filhos desde o nascimento e que no futuro os filhos cuidem dos pais. Nem sempre isso acontece”, destacou.

Ainda, de acordo com o psicólogo, as consequências emocionais podem ser de diferentes proporções. “Pode ser sentimental e até mesmo ir para o comportamental. O importante é o indivíduo buscar ajuda especializada”, afirmou.

Já o psicopedagogo clínico Cláudio Miranda acredita que a sensação de não ser querido pelo pai pode desencadear agressividade. 

“Ao longo da vida esses traumas podem piorar, conforme as relações que a pessoa abandonada estabelece. É importante buscar equilíbrio emocional”, pontuou.

Miranda acredita que para todo problema há solução. “A terapia é um dos caminhos para ajuda e fortalecimento interior em casos de abandono. É muito recomendável”, disse.

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