Filhos mais dependentes dos pais preocupam as famílias
Entre os especialistas, o temor é que a nova geração sofra com prejuízos no futuro devido à falta de estímulos em casa
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Ser capaz de assumir compromissos e de prestar contas diante de autoridades. É isso que muitos pais desejam para seus filhos no futuro. Mas crianças e adolescentes cada vez mais dependentes são motivo de preocupação para famílias e especialistas.
A psicopedagoga Mônica Monteiro explica que, de modo geral, o ser humano se sente dependente de algo ou alguém.
“Isso não é ruim e, em alguns momentos, é necessário. Porém, se os pais não souberem o tempo correto de dar autonomia, a criança não terá estímulos positivos para desenvolver sua identidade e autoconfiança, se tornando futuramente um adolescente inseguro e um adulto com traumas e medos”.
Para a especialista em Educação Janaína Spolidorio, é nítido que os filhos estão mais dependentes dos pais. “A grande preocupação é que isso afeta o desenvolvimento pessoal, cognitivo e social deles, trazendo prejuízos a sua qualidade de vida. Além disso, a dependência causa problemas de questões emocionais ligadas ao fracasso”.
O processo de autoconhecimento também pode ser afetado, segundo a psicóloga Talita Espíndula, especialista em crianças e educadora parental. “Sempre será necessário ter alguém para dizer o que é melhor ou não”.
Essa condição de dependência, porém, não é exclusiva da nova geração, salienta o consultor de carreira com foco em gerações Sidnei Oliveira.
“É, na verdade, uma mudança cultural profunda na sociedade moderna, que foi a criação de famílias menores, com uma dedicação muito provedora para esses filhos. Isso começou na década de 80 e vem se intensificando a cada década, o que cria uma geração de dependência dos pais”, explica.
Na avaliação da psicóloga clínica e comportamental Osmarina Vyel, esse cenário forma jovens enfraquecidos, sem opinião própria, sem noção de esforço para planejar e executar tarefas simples.
“A pergunta é: como será construída uma sociedade com seres tão enfraquecidos? Será que eles vão sair da dependência dos pais e vão para dependência artificial?”, questiona Osmarina.
“Noto que os pais estão despreparados para lidar com estes jovens, que são inteligentes e ágeis na tecnologia, mas não estão sendo preparados para a vida prática do dia a dia. Estamos criando crianças para um mundo que não é real”, alerta a psicóloga.
Excessos na internet podem aumentar a insegurança
No Brasil, 89% das crianças e dos adolescentes são usuários de internet e passam mais de cinco horas por dia, em média, conectados por celular, tablet ou computador.
Além dos prejuízos que o excesso na internet pode trazer à saúde, o comportamento contribui para a insegurança e a dependência, segundo os especialistas.
“As redes sociais mostram uma realidade que não condiz com o mundo real. Traz transtornos de personalidade, de imagem corporal, onde o adolescente vive um mundo em que todos parecem ser melhores do que ele, mais magros, ricos e saudáveis. E não é assim”, observa a pediatra Karoliny Veronese.
O acesso cada vez mais livre às redes sociais contribui para a insegurança do adolescente em todos esses aspectos e incentiva ainda mais o comportamento prejudicial, explica a psicóloga Rubia Passamai Navarro.
“Os pais, diante da insegurança, dos perigos e das dificuldades do mundo contemporâneo, tendem a ser mais superprotetores”, observa Rubia.
“Somado a isso, estamos vendo crescer a geração das redes sociais, que têm mais experiências virtuais do que reais e se priva dos prazeres e dos desprazeres que o viver de verdade proporciona”, completa.
Com isso, segundo a especialista em Educação Janaína Spolidorio, as crianças ficam dependentes das telas e da família.
“As redes acabam orientando um mundo falso para a criança e sua vivência entra em choque com o que se vive por lá, fazendo com que o mundo digital comece a fazer mais sentido, pois é o mais vivenciado pela criança e não demanda autonomia de vida”.
Aposta em acordos

Para o casal Laura Pacheco, 48, e João Manuel Pinha Pacheco, 49, investir em uma rotina de tarefas sem sobrecarregar os filhos João Rian Maia Pacheco, de 11 anos, e Paula Fernanda Maia Pacheco, de 9, é fundamental para que eles sejam independentes e responsáveis.
“Aqui em casa, apostamos em acordos, em uma linguagem clara e adequada para eles. Temos regras para eletrônicos, gostamos de estar em contato com a natureza e exercitamos a responsabilidade”, destaca Laura.
“Mas não é fácil, são muitos desafios. Investimos para conhecerem suas emoções, conversarem, brincarem, e para que sejam mais autoconfiantes”.
Tarefa para cada uma em casa

A professora Susane Kelly Santana Moraes, 44, sempre tenta ensinar as filhas Ana Beatriz Santana Moraes, de 14 anos, e Ana Clara Santana Moraes, de 5, a serem independentes. Para isso, cada uma tem suas responsabilidades e tarefas em casa.
“Minha filha mais velha sempre estudou para as provas sozinha, e faz os trabalhos da escola. Ela arruma seu próprio quarto e deixa as coisas organizadas para quando eu chegar em casa”, cita a mãe.
A mais nova também tem suas tarefas. “A Ana Clara toma banho sozinha, se alimenta, arruma seu próprio lanche para a escola, separa e guarda seus brinquedos. Desde muito novinhas, eu ensinei a ter o compromisso de ajudar. Acredito que, assim, serão muito bem-sucedidas e seguras no que fazem”, salienta Susane.
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