Aventuras de um gato para lidar com as diferenças
“Flow”, animação da Letônia favorita para levar o Oscar em duas categorias, utiliza os movimentos naturais dos animais
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Um gato solitário vê sua casa ser destruída por uma inundação e encontra abrigo em um barco repleto de diferentes espécies. Para sobreviver, ele precisa aprender a conviver com os outros animais, apesar das diferenças.
Essa é a trama de “Flow”, que vem surpreendendo o público. A animação, dirigida por Gints Zilbalodis, é uma dos favoritas ao Oscar 2025 nas categorias de Melhor Animação e Melhor Filme Internacional. Embora “Flow” possa parecer seguir a fórmula de outras animações de aventura, supera todas as expectativas.
Em vez de diálogos e canções pop, o filme aposta no silêncio como forma de narrativa, criando uma experiência única. Aqui, os animais não falam nem demonstram expressões humanizadas.
A história se desenrola em um mundo onde os humanos já não existem. Em meio à natureza, o gato curioso enfrenta desafios comuns à sua espécie.
Durante uma de suas explorações, ele foge de uma matilha de cães e acaba presenciando uma inundação. No meio do caos, encontra refúgio em um barco “conduzido” por uma capivara.
Com o tempo, novos companheiros se juntam à jornada: um lêmure, um labrador e um pássaro-secretário, uma ave de rapina africana. Apesar das diferenças naturais, a relação entre os animais, inicialmente marcada pela desconfiança, se transforma em cooperação.
O grupo segue em direção às ruínas de uma cidade ancestral, dominada por uma torre que se ergue até as nuvens. Cada etapa da viagem traz perigos, mas também oportunidades para descobertas.
Nesse universo fantástico, “Flow” se destaca por sua abordagem visual e narrativa, permitindo que a história seja contada exclusivamente pelos movimentos e comportamentos naturais dos animais.
Diferente das superproduções hollywoodianas, “Flow” foi criado com um software de código aberto, acessível a qualquer usuário. O projeto, desenvolvido pelo estúdio Dream Well, na Letônia, contou com uma equipe de 30 profissionais e levou pouco mais de cinco anos para ser concluído.
Crítica
Modéstia técnica e grandiosidade
Um gato preto perambula solitário por descampados de algum lugar indefinido, entre folhagens e rios, ora buscando comida, ora fugindo da perseguição de cães. De repente, uma enorme inundação põe a flora e a fauna inteiras sob risco.
A sinopse de “Flow” pode ser a de praticamente qualquer genérico de animação protagonizado por animais fofos e quase sempre tagarelas e frenéticos diante dos desafios enfrentados, mas o filme de Gints Zilbalodis desvia das obviedades.
São tantas camadas ao mesmo tempo simples e complexas que, em concisos 84 minutos, fica bastante compreensível o encantamento provocado ao longo de uma trajetória iniciada em maio de 2024, na competição Um Certo Olhar, do Festival de Cannes, e que inclui vitória no Globo de Ouro e duas indicações ao Oscar.
De imediato, essa animação da Letônia intriga pela decisão de não conter diálogos falados entre os bichos nem fazer deles animais antropomorfizados. Toda a comunicação é feita na movimentação corporal, nos sons, guinchos, ganidos e miados e nas expressões faciais. Isso faz de “Flow” um amontoado de gestos e delicadezas pinçado nos detalhes mínimos, seja em momentos de conflito ou de apenas amenidades entre os personagens.
Instantes aparentemente sem importância, como a ave que se impacienta com o labrador e joga para longe o brinquedo dele, ou a esforçada pescaria a que o gatinho se desafia para depois oferecer peixes aos companheiros de barco, formam um mosaico de acontecimentos tão ou mais eletrizantes do que cenas de perseguição e perigo.
O estilo rudimentar dos traços animados pelo software aberto Blender e a fotografia nervosa, que explora a profundidade dos espaços, ampliam o efeito emocional. “Flow” parece de fato querer nos inserir em seu mundo, em vez de seduzir por algum tipo de técnica altamente sofisticada.
Humanos são discretamente insinuados, mas nunca aparecem; monumentos felinos foram erguidos e podem ser vistos além do horizonte; baleias com perninhas saltam em meio à violenta inundação.
A grandiosidade imaginativa e a modéstia de sua elaboração o tornam incontornável no atual cenário mundial da animação.
Mais estreias
“Fé para o impossível”
O longa retrata a incrível história de superação de Renee Murdoch. No drama, a pastora norte-americana, que vive no Rio de Janeiro, foi tragicamente atacada durante uma corrida em setembro de 2012.
“The Moon: Sobrevivente”
No futuro próximo, a primeira missão tripulada da Coreia do Sul à lua termina em um trágico desastre. A ficção se passa cinco anos depois, quando uma segunda missão espacial tripulada é lançada com sucesso.
“Desafie a escuridão”
Baseado em uma história real, o filme destaca a transformação de um professor de uma pequena cidade nos anos 1980 que muda a sua vida quando ajuda o reservado Nate, um de seus alunos.
“O Macaco”
A trama acompanha os gêmeos Bill e Hal (Theo James), que descobrem um antigo macaco de brinquedo no sótão de seu pai. A partir desse momento, uma série de mortes terríveis começa a acontecer.
“O Brutalista”
Filme se passa em 1947, quando o arquiteto visionário húngaro László Toth (Adrien Brody) e sua esposa, Erzsébet (Felicity Jones), fogem da Europa devastada pela guerra em busca de um novo começo na América.
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