Oportunidade histórica para os cobradores de ônibus
O que ora acontece com os cobradores não é diferente do que vem ocorrendo com várias outrora consolidadas profissões, com espaços cada vez mais ocupados pelas inovações tecnológicas. O grande problema é que a humanidade não vem conseguindo acompanhar o ritmo das alterações, em termos de ocupação para os afastados, que se juntam a um enorme contingente de outros que nem inseridos estavam, interferindo fundamentalmente na elaboração e execução de qualquer política pública.
No caso, é importante salientar que os cobradores estão incluídos no contexto de uma política essencial, já que, de acordo com o artigo 227 da Constituição Estadual, “o transporte coletivo de passageiros é serviço público essencial, obrigação do Poder Público, responsável por seu planejamento, gerenciamento e sua operação, diretamente ou mediante concessão ou permissão, sempre através de licitação”.
Embora parta-se do princípio de que o sacrifício dos milhares de postos de trabalho dos cobradores advenha de planejamento que justifique a opção por tal medida extrema, forçoso ponderar que reflexos negativos para o sistema são nítidos, como a ausência do profissional para auxiliar no trato com os usuários, a previsível diminuição dos passageiros por não portarem o cartão etc.
A própria qualificação dos cobradores para outras funções não se mostra questão simples, já que nem todos possuirão aptidão para possíveis alternativas.
Além do que, cobradores que consigam ocupar a função de motorista, por exemplo, apenas estarão consolidando a transformação dos dois cargos em um.
Situações como a presente se constituem em oportunidades imperdíveis para profundas análises quanto à integração das políticas públicas, já que diretamente relacionada, dentre outras, com aquela que diz respeito, na melhor das hipóteses, aos seguros-desemprego, benefícios emergenciais, bolsas-família... Cujo contingente, não por acaso, aliás, só tem aumentado!
Bom exemplo a ser trazido refere-se às centenas de milhares de frentistas, que, não obstante as fortes turbulências enfrentadas, têm os seus postos de trabalho mantidos nas últimas décadas graças à lei 9.956, de 12.01.2000, que proíbe o funcionamento de bombas de autosserviço nos postos de abastecimento de combustíveis no País.
Enfim, como a questão é extremamente relevante, com pontos de vista fundamentadamente distantes, entende-se que se trata de oportunidade histórica para difundir em situações como tais, antes da implantação da inovação, a prévia realização de Estudo de Impacto Social.
Esse estudo, baseado na experiência da seara ambiental, se constituiria, basicamente, em um circunstanciado relatório técnico voltado para identificação e avaliação imparcial das consequências sociais da extinção dos postos de trabalho dos cobradores do sistema de transporte coletivo de passageiros.
Luiz Antônio de Souza Silva é promotor de justiça e escritor.