Médicos são pressionados a pedir menos exames, diz associação

Pesquisa aponta que 80,6% dos profissionais contaram ter restrições por parte dos planos de saúde

Eliane Proscholdt e Francine Spinassé, do jornal A Tribuna | 01/04/2022, 15:15 15:15 h | Atualizado em 01/04/2022, 15:15

Necessários para prevenir e identificar doenças, os exames são fundamentais para os pacientes. Só que uma pesquisa revela que médicos estão sendo pressionados a restringir as solicitações, além de se depararem com a negativa pelos planos de saúde.

Realizada pela Associação Médica Brasileira (AMB), em conjunto com a Associação Paulista de Medicina (APM), a pesquisa foi divulgada nesta quinta-feira, 31, e revela que 80,6% contaram ter restrições para pedidos de exames por parte das empresas.

Além disso, 53% afirmaram que já tiveram interferências (ou tentativas) no tratamento de pacientes por parte dos planos de saúde. 

Os dados foram coletados a partir de um questionário com a participação de 3.043 médicos brasileiros entre 25 de fevereiro e 9 de março, inclusive capixabas. 

“A partir dos relatos, de forma direta ou indireta, é possível ver que essa interferência acaba impactando na qualidade da assistência, no êxito do tratamento”, diz o presidente da AMB, César Fernandes.

A pesquisa mostra que 51,8% dos profissionais já tiveram dificuldades para internar pacientes, enquanto 53,1% passaram por situações em que os planos fizeram pressão para antecipar a alta.

Para o presidente da Associação Paulista de Medicina, José Luiz Amaral, as pressões e tentativas de interferência por parte das operadoras de saúde são situações graves e podem comprometer o resultado de um tratamento médico.

O presidente da Associação Médica do Espírito Santo (Ames), Leonardo Lessa Arantes, diz que “a mercantilização da medicina é um movimento que preocupa”. 

“Grandes grupos econômicos têm adquirido hospitais e planos de saúde, com a visão restrita no lucro. O médico, na outra ponta, se vê cada vez mais desprotegido diante dos oligopólios, sendo pressionado em seus ganhos financeiros e tendo a prática da boa medicina limitada por questões econômicas”.

Já o presidente do Sindicato dos Médicos do Espírito Santo (Simes), Otto Fernando Baptista, pede denúncias dos profissionais. 

“O médico tem de ter liberdade de solicitar o exame que ele achar conveniente. Ele não está ali para pedir exames sem fundamento”.

Precisou pagar em outro laboratório

srcset="https://cdn2.tribunaonline.com.br/img/inline/110000/372x236/inline_00114091_00/ScaleUpProportional-1.webp?fallback=%2Fimg%2Finline%2F110000%2Finline_00114091_00.jpg%3Fxid%3D314436&xid=314436 600w, Com uma infecção por fungo no olho, Pâmela dos Santos não teve autorização para fazer exame. “O meu caso é grave. Mesmo com plano de saúde, tive de pagar. É um descaso”, desabafa
 

Lutando contra uma infecção por fungo no olho, a assistente de vendas Pâmela dos Santos, 36 anos, ficou frustrada no último dia 9 ao ter um exame negado pelo laboratório credenciado, que atende seu plano de saúde.

“Estou com o problema há um mês, com suspeita de esporotricose, que é uma infecção causada por um fungo. Estou sendo acompanhada por um oftalmologista, um infectologista e imunologista”, contou Pâmela, que preferiu não divulgar o nome do plano de saúde.

Buscando respostas, foram solicitados exames. “Alguns, o plano cobriu, mas um que iria identificar o fungo foi negado. Pago o plano desde 2019 e tive esse exame negado. Se fosse pagar em uma das unidades credenciadas do plano, teria de desembolsar R$ 702”, relatou a assistente de vendas.

Sem ter como pagar pelo valor cobrado, Pâmela fez uma pesquisa em outros laboratórios que não eram credenciados do plano e conseguiu realizar o exame por R$ 200.

“É muito difícil a gente pagar um plano e, quando precisa fazer um exame, receber  ‘não autorizado’ na recepção do laboratório”, reclamou.


ENTENDA


A pesquisa

  • Chamada de “Os médicos brasileiros e os planos de saúde”, a pesquisa foi feita pela Associação Médica Brasileira (AMB), junto com a Associação Paulista de Medicina (APM).  
  • Foram ouvidos 3.043 médicos no País, entre os meses de fevereiro e março deste ano.
  • Os profissionais foram consultados por meio de uma ferramenta chamada Survey Monkey, especializada em pesquisas e questionários. 

Dos entrevistados

  • 59,2% homens
  • 40,8% mulheres

Perfil

  • Do total, 55,3% dos entrevistados contaram que atendem a planos de saúde há mais de 20 anos.
  • 51,7% disseram atender a cinco ou mais operadoras.

1 - Já sofreu ou sofre restrição do plano de saúde à solicitação e autorização de exames?

  • 60,8% - Às vezes
  • 19,8% - Com frequência
  • 19,4% - Nunca
  • 80,6% sofrem restrições a exames (com frequência ou às vezes).

2 - Já houve tentativa ou interferência em tratamentos propostos?

  • 40,9% - Às vezes
  • 12,1% - Com frequência
  • 47% - Nunca
  • 53% relatam tentativas ou interferências nos tratamentos (às vezes ou com frequência).

3 - Teve ou tem dificuldades para internar pacientes?

  • 45,1% - Às vezes
  • 6,7% - Com frequência
  • 48,2% - Nunca
  • 51,8% relatam dificuldades para internar pacientes (às vezes ou com frequência).

4 - Foi pressionado ou soube de colegas que foram pressionados a antecipar altas?

  • 39,5% - Às vezes
  • 13,6% - Com frequência
  • 46,9% - Nunca
  • Destaque: 53,1% relatam pressão para antecipar altas (às vezes ou com frequência).

5 - Pacientes seus, de planos de saúde, já largaram tratamentos em consequência de reajustes das mensalidades?

  • 88,3% Sim
  • 11,7% Não
Fonte: Associação Médica Brasileira e Associação Paulista de Medicina.

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