Dino libera pagamento de emendas parlamentares e impõe ressalvas
Decisão é mais um capítulo da queda de braço entre Congresso, governo e Supremo desde que o ministro suspendeu o pagamento das emendas parlamentares
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O ministro Flávio Dino, do STF (Supremo Tribunal Federal), liberou nesta segunda-feira (2) a retomada do pagamento das emendas parlamentares e fez duras críticas ao modelo, afirmando que "jamais houve tamanho desarranjo institucional com tanto dinheiro público em tão poucos anos".
A decisão é mais um capítulo da queda de braço entre Congresso, governo e Supremo desde que o ministro suspendeu o pagamento das emendas parlamentares, em 1º de agosto, e cobrou mais transparência no gasto de uma fatia bilionária do orçamento.
O STF começou a analisar também nesta segunda a decisão Dino em plenário virtual. Até as 19h, acompanharam o entendimento os minsitros Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso e Luiz Edson Fachin.
O julgamento ocorre desde às 18h e segue até as 23h59 de terça (3).
Dino definiu em sua decisão regras para a retomada de cada uma das emendas -individuais, "Pix", de bancada estadual e de comissão. As emendas de relator dos anos anteriores e as de comissão, por exemplo, só devem ser pagas pelo Executivo se houver a indicação do nome do padrinho.
O orçamento deste ano prevê mais de R$ 49 bilhões em emendas parlamentares. Assessores calculam que cerca de R$ 17,5 bilhões tenham sido bloqueados em agosto pelo ministro do supremo.
Um líder do centrão afirmou, sob a condição de anonimato, que espera um meio-termo do plenário do Supremo para que as regras mais duras sejam cobradas apenas daqui para frente. A avaliação dele é de que Dino "burocratizou demais" e criou empecilhos para o pagamento de emendas bloqueadas.
O parlamentar citou a cobrança de um plano de trabalho em até 60 dias para o pagamento das emendas "Pix" já indicadas -um tipo de emenda à disposição de cada um dos congressistas que caía direto no caixa das prefeituras sem qualquer informação de como o dinheiro deveria ser usado.
Segundo ele, o sentimento do Congresso é de que a nova lei já resolve o problema de falta de rastreabilidade. Ao colocar novas exigências, continua, o ministro mantém a impressão de que está jogando a favor do governo Lula (PT).
O bloqueio das emendas abriu considerável mal-estar com o Congresso e motivou a aprovação de um pacote de medidas na Câmara dos Deputados que limita o poder de ministros do STF. Na semana passada, parlamentares também condicionaram a aprovação do pacote de gastos à liberação do dinheiro.
Dino afirmou que relatórios feitos pela CGU (Controladoria-Geral da União) deixam claro que os requisitos constitucionais de transparência e rastreabilidade estão sendo descumpridos, em "engrenagem flagrantemente inconstitucional", com bilhões de reais "se multiplicando em escala geométrica".
"É precoce afirmar -e nem se constitui objeto específico destas ações (processos estruturais)- que houve ou há crimes em razão da esdrúxula situação constatada. Mas é de clareza solar que jamais houve tamanho desarranjo institucional com tanto dinheiro público, em tão poucos anos. Com efeito, somadas as emendas parlamentares entre 2019 e 2024, chegamos ao montante pago de R$ 186,3 bilhões."
Na decisão de 65 páginas, o ministro também escreve que, diante deste cenário, não é excessivo apontar que há quatro modelos no mundo: o presidencialismo, o parlamentarismo, o semipresidencialismo e o do "Brasil, com um sistema de governo absolutamente singular no concerto das nações".
Dino decidiu ainda que o monitoramento das emendas, objeto da ação que tramita sob sua relatoria, se estenderá ao exercício financeiro de 2025, "com a realização periódica de audiências de contextualização e conciliação, bem como novas auditorias, quando necessárias".
O magistrado fez duras observações sobre a resposta do Congresso em relação às emendas de comissão -que foram turbinadas com o fim das emendas de relator, em 2022. Na semana passado, Câmara e Senado reafirmaram que não seria possível identificar os padrinhos das indicações porque as decisões foram "colegiadas".
"Cogitando ser verdadeira a reiterada afirmação das advocacias do Senado e da Câmara de que é impossível recompor plenamente o itinerário percorrido para a execução pretérita de parte expressiva das emendas parlamentares, temos a gravíssima situação em que bilhões de reais do Orçamento da nação tiveram origem e destino incertos e não sabidos", escreveu.
O pagamento das emendas parlamentares havia sido suspenso por Dino em agosto, em ação movida pelo PSOL, até que houvesse "prévia e total rastreabilidade" dos recursos. Na ocasião, o bloqueio foi confirmado pelo plenário do Supremo, por unanimidade.
Para tentar destravar o dinheiro, o Congresso aprovou projeto de lei -sancionado sem vetos pelo presidente Lula- que muda parte das regras de distribuição a partir do ano que vem. Segundo a Consultoria de Orçamentos do Senado, porém, a lei avança pouco em relação às exigências do tribunal.
"Vamos tentar dissecar essas diferenças na decisão do ministro Flávio Dino em relação ao projeto aprovado. Vamos tentar, de toda maneira, apaziguar e voltar a normalidade no Congresso Nacional, para que os Três Poderes mantenham o que sempre foi preconizado na Constituição, harmonia e independência", disse o relator do Orçamento de 2025 e do projeto de lei, senador Ângelo Coronel (PSD-BA).
O líder do PSB no Senado, Jorge Kajuru (GO), afirmou que a decisão de Dino está "corretíssima" e que há "parlamentares apaixonados por emendas que não querem cortar na própria carne".
"São um bando de famintos [congressistas], ele tem que ser rigoroso. Quem não é faminto respeita a opinião do ministro. Tem que ter critério mesmo. Como você manda um dinheiro para um prefeito e não especifica para onde vai?", questiona.
VEJA AS REGRAS ELENCADAS POR DINO PARA LIBERAÇÃO
Emendas de relator (de anos anteriores) e de comissão: só devem ser liberadas se houver a identificação dos parlamentares. Cabe ao Executivo aferir a transparência e liberar caso a caso.
Emendas "Pix": só devem ser liberadas de agora em diante com plano de trabalho prévio e em contas bancárias específicas indicadas pelas prefeituras (como definido pela nova lei). Já as emendas anteriores a 2025 só devem ser pagas se o deputado ou senador apresentar o plano de trabalho em até 60 dias.
Emendas de bancada: o ministro diz ser "fundamental que não haja individualização da emenda" e determina auditoria em outubro de 2025 para acompanhar o processo.
Emendas para ONGs: só podem ser liberadas com a devida publicação nos sites das entidades, tanto as futuras como as que já foram indicadas.
Emendas para a saúde: precisam de indicações técnicas do gestor federal, com necessidade de aprovação prévia nas comissões bipartite e tripartite do SUS.
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