"Acolher os filhos não é o mesmo que mimar", diz educadora

| 19/03/2021, 16:38 16:38 h | Atualizado em 19/03/2021, 16:52

A missão de educar um filho para enfrentar o mundo não é fácil, e não há uma “receita pronta” que funcione para todos. Muitas vezes, tentando acertar e oferecer o melhor para os filhos, os pais cometem erros, como acatar a todos os seus desejos com o intuito de fazê-los felizes o tempo inteiro.

A escritora e educadora Telma Abrahão enfatiza que os pequenos precisam se sentir valorizados e acolhidos, o que não significa mimá-los.

“O mimar enfraquece a criança e impede que ela desenvolva importantes habilidades de vida. Como ela vai desenvolver resiliência, força de vontade e persistência se consegue tudo o que quer na hora que quer?”, questiona.

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A permissividade é uma conduta adotada por muitos pais que não sabem como lidar com os filhos. Como consequência, a criança não aprende a lidar com frustrações e sente o impacto também na vida adulta.

“Quando os pais dizem ‘não’ ao filho, explicam o motivo da negativa e indicam quando esse ‘não’ poderá ser um ‘sim’, se torna mais fácil para a criança administrar suas emoções”, orienta Telma.

O ideal é adotar essa postura desde bem cedo com o filho. Quando a família já tem o costume de atender todos os desejos da criança, também dá para mudar de conduta. É necessário resistência dos pais em ceder, o que pode ser difícil, mas é possível.


Quem é Telma Abrahão


  • Biomédica, educadora parental e especialista em educação emocional.
  • É uma das pioneiras no Brasil a unir ciência e educação dos filhos.
  • No ano passado, lançou o livro “Pais Que Evoluem – Um novo olhar para a infância”.
  • A obra se tornou best-seller e chegou ao 1º lugar na Amazon Brasil.
  • O livro traz uma reflexão sobre a importância do papel dos pais nas atitudes e na educação emocional dos filhos.

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A Tribuna – Quais são os desafios dessa nova geração de pais que não existiam antes?

Telma Abrahão – Sempre existiram dificuldades na criação dos filhos. A diferença é que, antigamente, as mulheres não trabalhavam tanto fora e estavam mais à disposição dos filhos. Mãe, avó, tia, vizinha... todas eram mais disponíveis e formavam uma rede de apoio muito maior para criar e educar as crianças.

Hoje, os adultos estão na correria fora de casa. As crianças nunca ficaram tanto tempo longe dos pais. Então, o que acontece é que, quando eles chegam em casa, os pequenos estão carentes e tristes por causa desse distanciamento. As crianças sentem que não são prioridade.

Durante a pandemia, o que aconteceu foi que todos passaram mais tempo em casa juntos e os pais não souberam lidar com os filhos.

É comum pais serem muito permissivos quando não sabem lidar com os filhos?

Sim. Na realidade, acontecem dois extremos: ou vão para o autoritarismo de querer sempre ter razão e ter a única voz a ser ouvida o tempo todo; ou vão para o lado oposto, em que, se a criança chora, eles dão o que essa criança quer.

Nenhum desses extremos é saudável. O autoritarismo não leva em consideração o que a criança pensa e sente, e é importante que ela se sinta acolhida. Já quando os pais são muito permissivos, a criança fica sem limites.

Quais as consequências da falta de limite?

A criança fica sem referência do que é certo ou errado, o que gera insegurança para ela. Com a permissividade, o filho passa a entender que ele ganha tudo o que quer no choro e no grito. Isso se torna um comportamento repetitivo e dificulta a educação.

Tem pai que não impõe limite para não ter de lidar com a frustração do filho. Pais têm que aprender que é possível andar no equilíbrio, no caminho do meio. Dá para falar com a criança de forma respeitosa e, ainda assim, dizer ‘não’. E a criança tem direito de chorar, até para aprender a lidar com os próprios sentimentos e emoções.

Como deve ser o acolhimento das emoções da criança?

Com empatia, com capacidade de se colocar no lugar do filho. Se recordar de quando era criança e lembrar de como gostava de ser tratado. Parar e olhar nos olhos do filho e ouvir o que ele tem a dizer.

Quando a criança sente que o pai a escuta e que sua emoção foi validade, ela se sente acolhida.

Mas não é porque o filho está triste que o pai deve deixá-lo fazer o que ele quiser. A frustração faz parte. Nós vivemos em uma sociedade em que regras são importantes e todos temos que respeitar e lidar com frustrações.

Quando os pais dizem ‘não’ ao filho, explicam o motivo da negativa e indicam quando esse ‘não’ poderá ser um ‘sim’, se torna mais fácil para a criança administrar suas emoções.

Qual a diferença entre acolher e mimar?

O mimar é quando os pais cedem a qualquer frustração do filho para fazê-lo feliz 100% do tempo. O mimar enfraquece a criança e impede que ela desenvolva importantes habilidades de vida.
Como ela vai desenvolver resiliência, força de vontade e persistência se consegue tudo o que quer na hora?

O encorajamento para ir atrás do que se deseja é fundamental de ser construído na infância. Se o pai dá tudo para o filho, ele indica que não confia na capacidade da criança em sobreviver à frustração. E a criança sente que o pai não confia nela, o que afeta a sua autoestima e até sua vida adulta.

Muitos adultos se sentem incapazes e não vão atrás dos próprios sonhos porque, na infância, os pais faziam tudo por eles.

Os pais fazem isso com amor, mas quando entendemos o que motiva o ser humano, entendemos que mimar não é o mesmo que acolher e encorajar. A criança tem necessidade de se sentir útil e capaz.

Como agir quando a criança já está condicionada a não querer lidar com frustrações?

Os pais precisam se posicionar. Se a criança estiver gritando e chorando para pedir algo, tem de dizer a ela que, quando ela falar de forma gentil, ela será escutada.

Pais têm de quebrar esse ciclo vicioso. Parar de dar atenção negativa e passar a dar atenção positiva de forma pró-ativa. Ou seja, dar atenção ao filho quando ele estiver se comportando bem. Muitos dão atenção apenas quando os filhos estão se comportando mal, ou para chamar a atenção e brigar, ou para fazer o que a criança quer.

Primeiro, é preciso abastecer a criança afetivamente. Assim, ela tende a se comportar melhor. E quando estiver se comportando bem, dedicar um tempo para passar com o filho para conversar e dar uma atenção positiva a ele.

A postura dos pais deve ser a mesma com todos os filhos?

Cada filho é diferente um do outro, e educar é um processo cheio de erros e acertos, pois nunca seremos perfeitos. O grande problema é tentar comparar o segundo filho com o que veio primeiro. É preciso entender a individualidade do ser humano. O que funcionou com o primeiro pode não funcionar com o segundo, ou o inverso.

Existe algum aspecto da parentalidade que está mais simples na atualidade?

Hoje, temos acesso a um conhecimento que não tínhamos antes. A ciência do comportamento humano e a neurociência avançaram muito nas últimas décadas para entender como funciona o cérebro.

As pessoas estão buscando mais o autoconhecimento, querem se entender e saber como podem melhorar. Esses são pontos positivos para as relações humanas.

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