Qualquer dinheiro poupado sempre serve a um fim útil
É praticamente impossível definir o limite de nossos desejos em relação à fortuna. Assim afirma Arthur Schopenhauer (1788-1860) ao tratar da questão intitulada: “O que um homem tem”. Decerto, continua o filósofo, “a condição humana é tal que não surpreende que o dinheiro seja estimado mais intensa e sinceramente que qualquer outra coisa”, levando muitos a pôr de lado ou até passar por cima de qualquer outra consideração quando se trata de adquirir riquezas.
Acusam-se amiúde os homens por seus objetivos dirigirem-se principalmente ao dinheiro. É muito inteligível, no entanto, que se almeje aquilo que a qualquer momento está pronto a assumir a forma do objeto atual de nossos desejos ou de nossas necessidades tão diversas e cambiantes.
De fato, conquanto qualquer outro bem satisfaça apenas um único desejo – por exemplo, os alimentos não valem senão para quem tem fome, os medicamentos para o enfermo e o cobertor para o frio –, o dinheiro, ao contrário, se transforma em todas as coisas.
Por outro lado, a origem de nossa insatisfação está em nossos esforços quase sempre renovados para elevar o fator de nossos prazeres. Enquanto que, à maioria das pessoas, os recursos disponíveis para tanto permanecem relativamente fixos.
Por isso, parafraseando o grande filósofo: a riqueza é como a água do mar. Quanto mais se consome, mais sede produz.
“A fortuna disponível, em vez disso, deve ser considerada como um baluarte contra o grande número de males e desgraças que podem suceder”. Não é prudente, pois, considerá-la uma permissão e ainda menos uma obrigação esbanjá-la.
Para além de postulados econômicos, como o de que “o princípio da riqueza é a parcimônia”, ou que “a fartura consiste em gastar menos do que se ganha”, é prudente conservar a fortuna, adquirida ou herdada, pois constitui vantagem inapreciável possuí-la, ainda quando não baste mais que para permitir viver comodamente.
Ademais de seu efeito prático sobre o sistema de preços ou lei da oferta e procura, na parcimônia reside “a imunidade que exime das misérias e dos tormentos da vida humana”.
Em momentos de crise, como a que acomete atualmente milhares de brasileiros, ela se afigura como emancipação de tormentos, que de certo modo deveriam ter sido previsíveis.
Salvo o caso daqueles que desafortunadamente padecem do terrível infortúnio da pobreza, muitos a potencializam, pois vivem na romântica ilusão de acreditar que seu “talento” é um capital permanente e que o dinheiro que ele produz é, por conseguinte, apenas o juro disso. Assim, não reservam nada daquilo que ganham a consolidar um pequeno estoque.
É certo que a situação inflacionária do País concorre para depreciação do dinheiro, diminuindo seu poder de compra. O que se propõe com essa reflexão é lembrar que qualquer dinheiro poupado sempre serve a um fim útil. Se não for empregado nos momentos difíceis, são propícios aos cuidados da família. Por isso, diz-se: mais vale o duro, que o desnudo.
Flávio Santos Oliveira é professor e doutor em História.